Um Dia na Aldeia
Com a realização de palestras, pretendemos conscientizar as novas gerações de jovens não-indígenas sobre a importância etnoambiental dos povos indígenas, contribuindo para a informação e a desconstrução de preconceitos que se encontram enraizados há várias gerações na cultura não-indígena do entorno de nossa Aldeia.
O preconceito que sofremos quando estamos na cidade e as informações erradas a nosso respeito são muito prejudiciais para nosso bem-estar e nossa relação com a sociedade em geral. As palestras ajudam a diminuir esses problemas, além de ajudarem a diminuir as atividades ilegais de vizinhos, como caça ilegal, coleta de nossas castanhas, pesquisa de garimpo, tentativa de grilagem, e outros conflitos que sofremos desde sempre.
A divulgação mais ampla também fortalece essa transformação de pensamento, nos fortalece institucionalmente e nos permite ser protagonistas de nossos conhecimentos para os habitantes entorno, mas também no meio acadêmico e de especialistas que sempre falaram pela gente. Participamos de espaços regionais e de maior alcance para mostrar nossa realidade do ponto de vista de quem mais sabe sobre ela.
Por isso o Dia na Aldeia vem atuando em escolas públicas e escolas privadas, institutos federais, universidades públicas e privadas, além de outros espaços institucionais.
A história do projeto
Em 2013, servidores da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) se deram conta de que a situação de fiscalização e monitoramento na região sul da Terra Indígena Uru Eu Wau Wau, especialmente na área da rodovia federal BR-429, em Rondônia, se tornava bastante trabalhosa em relação a pequenas infrações constantemente repetidas: invasões para pesca, coleta de castanha, retirada de madeira e atividades de garimpo.
Preocupado com a situação, o indigenista Rieli Franciscato, então coordenador da Frente de Proteção Etnoambiental Uru-eu-wau-wau (FPE-Funai), começou a acreditar que um trabalho de base nas comunidades do entorno do território poderia funcionar de maneira mais efetiva no combate a esses crimes. Procurou Walter Meira, coordenador-substituto da mesma Frente, e idealizaram juntos a primeira versão do projeto, primeiro chamado Um Dia de Campo, hoje rebatizado como Um Dia na Aldeia.
Em Seringueiras-RO, realizaram palestras para as crianças das escolas rurais, informando sobre ações realizadas pela Funai, falando da importância do território do ponto de vista ambiental, e da proteção dos indígenas em isolamento que ali habitam. O momento buscava, também, apontar a diferença da ocupação indígena e não-indígena, sendo a primeira em consonância com a existência da floresta, e a segunda, predatória. Ao final, os estudantes que demonstraram maior envolvimento com a temática trabalhada foram selecionados para visitar a base da Frente de Proteção Etnoambiental (FPE-Funai) na Terra Indígena, e ver de perto um pouco daquilo que haviam escutado.
Desde as primeiras versões do projeto, o povo Amondawa participou apresentando seu modo de vida e demonstrando a relação com a floresta, que se mantém mesmo após o estabelecimento definitivo de seu contato com não-indígenas, em 1987. A atividade de campo é planejada em estações que apresentam na prática os temas trabalhados, com os Amondawa apresentando, em sua própria estação, as plantas importantes para alimentação, medicina, construção de casas e produção de artefatos.
O projeto surgiu a partir da necessidade de levar para a sociedade do entorno informações a respeito da importância do território para os povos isolados e da minimização dos crimes ambientais cometidos pelos moradores da vizinhança. Se repetiu, realizado pela Funai, nos anos de 2014, 2015 e 2016, crescendo e alcançando profissionais liberais, professores, servidores públicos e acadêmicos, se estendendo aos municípios rondonienses de São Miguel, São Francisco e Izidrolândia, neste último objetivando informar a respeito da mesma temática, mas tendo como foco a Terra Indígena Massaco, demarcada exclusivamente para povos que vivem em isolamento.
Protagonismo Amondawa
Após a trágica morte de Rieli Franciscato em 2020, atingido por uma flecha no coração em um momento de grande tensão para os grupos em isolamento na região, pressionados por inúmeras invasões, a comunidade indígena Amondawa, para quem Rieli era uma figura de grande importância, sentiu a ausência dele de muita formas, inclusive dos impactos positivos do projeto que ele coordenava.
O Dia na Aldeia promovia a proteção territorial, o combate ao preconceito contra povos indígenas na região, informava sobre a importância ambiental do território e sobre o respeito aos povos indígenas isolados, por meio da educação. O projeto fazia diferença e fez falta.
Em 2023, dez anos após sua primeira versão, o projeto então voltou com uma nova abordagem: proposta e executada pela Associação do Povo Indígena Amondawa (Apia), nas escolas dos municípios de Mirante da Serra e Nova União.
A retomada do projeto teve financiamento da Inter-American Foundation (IAF), e foi realizada em parceria com o Observatório dos Povos Indígenas Isolados (Opi), a Universidade Federal de Rondônia (Unir), a Frente de Proteção Etnoambiental Uru-eu-wau-wau (FPE-Funai) e a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab).
Desde então, o Dia na Aldeia vem crescendo e alcançando mais espaço e públicos, sendo procurado para atuar em diversos setores.